A 57ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou uma churrascaria a pagar indenização de R$ 100 mil por danos morais e multa por litigância de má-fé pela dispensa discriminatória de um trabalhador com câncer. A empresa alegou que teve conhecimento da doença apenas com a citação do processo e que a dispensa do reclamante estava inserida dentro do seu “poder de gestão”. Para a juíza Luciana Bezerra de Oliveira, os fatos demonstraram o contrário, e a indenização arbitrada não deve seguir o tabelamento previsto na reforma trabalhista (artigo 223-G, § 1º da CLT), mas, sim, reparar efetivamente o dano causado.
Atuando por quase sete anos na churrascaria, o garçom foi dispensado dois meses após receber alta previdenciária. Embora a defesa alegasse o desconhecimento do câncer linfático, o preposto confessou que todo o tratamento – que incluiu quimioterapia, radioterapia e internação – foi realizado pelo plano de saúde da empresa, e que a reclamada tinha um parecer do médico do trabalho indicando que o trabalhador “estava apto, mas não curado”.
De acordo com a magistrada, o empregador não comprovou que o rompimento do contrato ocorrera por dificuldades financeiras. A reclamada juntou documentos para demonstrar que outras pessoas foram desligadas na mesma época. No entanto, constatou-se simples substituição de mão de obra, e não corte ou redução de quadros.
“É evidente que o rompimento do contrato de trabalho, em um momento tão delicado e complicado, trouxe ao reclamante danos de natureza moral. No momento da dispensa, o reclamante, ainda com necessidade de prosseguir com seu tratamento, foi impedido de utilizar o plano de saúde contratado pelo empregador; permaneceu desamparado e, conforme consulta ao CAGED, continua desempregado até os dias atuais”, ressaltou a juíza.
De acordo com o entendimento da magistrada, o Brasil é signatário da Convenção 111 da OIT, a qual versa sobre a não discriminação, em qualquer modalidade, o que abrange doenças graves e estigmatizantes como a do reclamante, e cabe ao empregador, conforme jurisprudência recente, provar o motivo que justifique a dispensa e afaste a presunção de conduta discriminatória.
A decisão pontua ainda o caráter inconstitucional da nova regra trazida pela reforma trabalhista, que impõe o valor do salário do ofendido como base de cálculo para pagamento da indenização por danos extrapatrimoniais. Aplicada a regra, exemplifica a magistrada, um ajudante e engenheiro que tivessem sofrido o mesmo acidente e perdido o mesmo membro, receberiam valores distintos. “A dignidade de um não pode valer mais do que a dos outros dentro de um mesmo acontecimento, no mesmo lugar e ao mesmo tempo”, justificou.
Obs.: o processo está pendente de trâmite e posterior julgamento de recurso ordinário.
Fonte : TRT2