No dia 17 de janeiro de 2021, a ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou, por unanimidade, o uso emergencial das vacinas CoronaVac e AstraZeneca para a imunização contra o coronavírus.
Diante disso, uma questão começou a ser alvo de discussão e dúvidas entre as diversas searas do Direito: as empresas podem obrigar seus empregados a se vacinarem?
Antes de elucidarmos o assunto, é bom lembrar que as empresas ainda não podem comprar vacinas para imunizar seus empregados, no entanto, já é possível prever alguns cenários quando da liberação do plano de imunização no âmbito do trabalho.
O que o STF diz sobre isso?
Em decisão recente no julgamento das ADIs 6586 e 6587 e ARE 1267879, o STF concluiu que os entes federativos – União, Estados, Municípios e Distrito Federal – podem determinar a vacinação obrigatória, contudo, não podem exigir a imunização com medidas invasivas e com o uso da força, ou seja, é plenamente possível a vacinação compulsória, vedada, no entanto, a vacinação forçada.
Tal posicionamento se amolda ao entendimento de que o Estado, nos termos da Constituição Federal, é responsável pela promoção da saúde coletiva – direito fundamental, e, para tanto, deve proporcionar a toda a população interessada o acesso à vacina para prevenção da COVID-19.
Janine Karla Pereira da Câmara Ribeiro retrata tal obrigação quando expressa seu posicionamento no livro A Efetividade Do Direito Fundamental Social à Saúde: “Assim, ao Estado cabe o papel de executor do direito fundamental à saúde, criando elementos hábeis a agirem na defesa desses interesses, promovendo a forma mais eficaz de subsidiar o direito tutelado”. (pág.31)
As empresas podem obrigar seus empregados a se vacinarem contra a COVID-19?
A grande questão está justamente na compatibilização do entendimento da Suprema Corte com as situações fáticas e jurídicas advindas do Direito do Trabalho, como, por exemplo, no plano das relações de trabalho, com os direitos e obrigações.
Considerando que a vacinação é uma política pública de saúde coletiva e, portanto, supera os limites individuais, cabe ao empregado colaborar com as políticas de contenção da pandemia COVID-19. Tal entendimento se firma nos pilares do estado democrático de direito e na efetivação dos direitos sociais – a saúde, direito a informação e da dignidade da pessoa humana. Por isso, é preciso considerar alguns pontos importantes na construção de tal pensamento.
O fato é que estamos diante de dois extremos: a vacinação obrigatória em prol da defesa da coletividade e de outro lado a exigência do empregador pela vacinação do empregado. Há conflito de interesse público e direitos individuais. E o que fazer?
É preciso considerar que o empregador deve fazer a manutenção do ambiente de trabalho a fim de que esse seja um local sadio para a realização das atividades laborais, conforme prevê o art. 7º XXII, da Constituição Federal, e artigo 159, da CLT.
De igual forma, o empregador, mediante seu poder diretivo, pode estabelecer exigências para a contratação e manutenção dos empregos, política de aplicação de penalidades e promover a organização das normas do trabalho.
Em contrapartida, o empregado possui o direito de não querer se vacinar, pois está acobertado, por exemplo, pela inviolabilidade do corpo – direito individual e pode apresentar um motivo excepcional e justificável para se opor a vacinação.
Dito isso, considerando as pontuações feitas até o momento, parece-nos viável concluir que, em se tratando de uma questão de saúde pública, em que o direito à saúde coletiva deve ser assegurado pelo Estado, cabendo a ele a promoção de medidas protetivas e preventivas a fim de que haja o enfrentamento da pandemia, e ainda, que o empregador é responsável por manter o ambiente de trabalho seguro, pode haver a exigência da vacinação de empregados e, a recusa em vacinar deve ser avaliada pela empresa, antes da tomada de postura em relação à manifestação do empregado pela não vacinação.
O que acontecerá se o empregado se negar a vacinar?
Não há nenhuma previsão legal quanto a possíveis penalidades quando o empregado se negar a se vacinar contra a COVID-19, mas, com base no atual posicionamento da Suprema Corte e em uma interpretação análoga ao artigo 158, parágrafo único da CLT, pode-se concluir que o empregador pode penalizar o empregado que se recusa a vacinar, por exemplo, com aplicação de multas e restrições de circulação.
Ademais, considerando também que o empregador busca proteger o local de trabalho e a coletividade, é plenamente admissível que o empregador aplique penalidades para estabelecer uma política de adoção de medidas de prevenção e combate ao contágio de doenças, no caso da COVID-19.
Contudo, é fundamental destacar que, somente a recusa injustificada do empregado à vacinação poderá caracterizar ato faltoso e, com possibilidade de aplicação das sanções previstas na CLT. Além do mais, antes de qualquer sanção, é necessário que se busque uma avaliação clínica através do médico do trabalho responsável pela elaboração e organização do PCMSO da empresa.
O empregado pode ser demitido em razão da recusa da vacinação?
Não havendo recusa que justifique a oposição a vacinação pelo empregado, ele deverá ser afastado do ambiente laboral coletivo, haja vista o risco a imunização dos demais empregados.
Nessa situação, o empregador poderá aplicar sanções disciplinares e, até mesmo, a demissão por justa causa, tendo em vista a proteção da coletividade de empregados. Contudo, se recomenda a criação de normas internas com indicação de punições gradativas, até culminar em eventual justa causa.
Em contrapartida, quanto aqueles que apresentarem motivos que justifiquem a recusa em tomar a vacina, deve-se buscar alternativas de proteção pelo empregador, sempre que possível, a exemplo das gestantes, àqueles com contraindicação médica e os alérgicos aos componentes da vacina.
Destacamos que é fundamental a análise de cada caso concreto, para a tomada de decisão segura também juridicamente.