A 4ª Câmara do TRT-15 deu provimento parcial ao recurso de uma reclamante, uma revendedora de cosméticos de uma renomada empresa de venda direta, e reconheceu a existência de vínculo de emprego entre a trabalhadora e a reclamada, pelos seis anos em que esteve a serviço da empresa. A decisão condenou a ré ao pagamento das verbas trabalhistas devidas, à retificação da carteira de trabalho da revendedora e à comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias e dos depósitos faltantes do FGTS, sob pena de multa de 20% do salário mínimo por dia de atraso, em favor da autora.
O juízo da Vara do Trabalho de Pindamonhangaba havia julgado improcedentes os pedidos da trabalhadora, sob o argumento de que ela “não se sujeitava a ordens e cumprimento de horários, nem se submetia ao poder hierárquico/disciplinar da reclamada, não configurando a prestação de serviços nos moldes estabelecidos nos artigos 2º e 3º da CLT”.
Porém, para a revendedora, que afirma ter atuado na função de “consultora orientadora”, a relação de emprego encontra-se plenamente caracterizada, isso porque, no período de 31/7/2008 a 15/9/2014, ela orientava as consultoras do grupo comunicando a respeito dos encontros, das promoções, dos lançamentos e eventos, com o objetivo principal de “manter os consultores no grupo e fazer novos cadastros”.
A empresa, em sua defesa, negou o vínculo e afirmou que a relação comercial entre as partes é de “prestação de serviços atípicos”.
O relator do acórdão, o juiz convocado Carlos Eduardo Oliveira Dias, observou que, de acordo com o Contrato de Prestação de Serviços Atípicos, a reclamante, além de consultora, passou a atuar também como consultora orientadora, “cujas atribuições, em suma, consistiam em identificar e cadastrar candidatas a revendedoras e coordenar um grupo de revendedoras da reclamada, orientando-as, motivando-as e prestando-lhes suporte, atividades essenciais ao empreendimento”. A contraprestação pelos serviços descritos era feita “a cada ciclo de vendas, oportunidade em que a reclamada pagava valores fixos para cada um dos grupos de revendedoras mantidas em atividade e gratificações por ‘pontos’ alcançados por estas, fator que se relaciona com o valor das vendas realizadas”.
Para o colegiado, é “evidente que a reclamada contratou a reclamante como selecionadora de novas revendedoras e coordenadora de grupo de vendas, remunerando-a pelo número de vendedoras a si vinculadas e pelo volume das vendas”, como reconhece a própria empresa, ao afirmar que a consultora orientadora, “além de revender os produtos da reclamada mediante emissão de nota fiscal, recebe contraprestação pela indicação de novas consultoras pela motivação comercial do grupo”.
O acórdão afirmou que essa relação trata de “prestação pessoal de serviços não eventuais de recrutamento e coordenação, mediante salário, de forma subordinada, fatores que evidenciam o liame empregatício entra as partes”.
A prova testemunhal, segundo o colegiado, corroborou ainda mais essa conclusão, quando declarou, dentre as atribuições da reclamante, que “orientava cerca de 200 pessoas e tinha que cumprir metas mensais de venda; também realizava vendas; só receberia pagamento se atingisse a meta de 60% de vendas do grupo; que caso não atingisse a meta, recebia o pagamento de R$ 300; que trabalhava em sua residência ou qualquer outro local, ressaltando que já recebia notificações pelo telefone da gerência, a partir das 9h. Em média, a cada 15 dias, tinha de estar ‘online’ até à 0h”, entre outras.
A testemunha indicada pela empresa, que trabalha na função de orientadora desde 2009, declarou que as consultoras possuem as atribuições de orientar grupo de consultoras, fazer cadastros e vender produtos.
Para o colegiado, como se tudo isso não bastasse, “as funções desempenhadas pela reclamante estão inseridas no objeto da sociedade, que é, entre outras, ‘a exploração do comércio de exportação e da importação de produtos de beleza, higiene, toucador, produtos cosméticos, artigos de vestiário’, e também ‘a prestação de serviço de qualquer natureza, tais como relacionados a tratamentos estéticos, assessoria mercadológica, cadastro, planejamento e análise de risco'”.
O colegiado concluiu, assim, que a prestação de serviços da recorrente na atividade final da reclamada “atrai o reconhecimento do vínculo (inteligência do item III da Súmula 331 do TST)”, e acrescentou que “a própria natureza dos serviços prestados pela reclamante já evidencia a fraude perpetrada”, uma vez que “as atividades exercidas estão vinculadas à atividade-fim da reclamada”. Nesse sentido, a Câmara entendeu, por unanimidade, que “o trabalho da autora insere-se na atividade natural do empregador, sinal evidente de que não poderia laborar de outra forma jurídica senão como empregado”.
Fonte : TRT15