O juiz Mauro Santos de Oliveira Goes, titular da Vara do Trabalho de Guaraí (TO), condenou um empregador a pagar pensão por morte para a viúva de um trabalhador falecido, por ter deixado de recolher as contribuições previdenciárias durante o pacto laboral. De acordo com o magistrado, se o empregador tivesse cumprido a lei e feito os devidos recolhimentos, a viúva do falecido estaria recebendo regularmente o benefício previdenciário.
O espólio do empregado, falecido em abril de 2017, e sua esposa, autores da reclamação, contam que o empregado prestou serviços para o empregador como trabalhador rural, sem registro na Carteira de Trabalho, entre outubro de 2014 e novembro de 2016, quando teria sido demitido de forma discriminatória, segundo os autores, por conta de uma doença que o acometia.
A ausência da anotação do registro na Carteira de Trabalho acarretou a omissão em fazer os recolhimentos das contribuições previdenciárias do falecido, o que levou a viúva a não poder usufruir do benefício previdenciário cabível, no caso a pensão por morte. Com esse argumento, os autores pediram a condenação do empregador ao pagamento de reparação patrimonial, baseada na equivalência ao prejuízo causado.
Danos materiais
No tocante ao pedido de pagamento de pensão por morte, a defesa sustentou falta de legitimidade para responder a ação em relação pleito. Para o empregador, quem deveria responder à ação, nesse ponto, seria o INSS, sujeito jurídico competente para concessão.
Na sentença, o magistrado rebateu esse argumento ao argumento de que a pretensão de receber, em substituição ao INSS, o valor correspondente à pensão por morte que foi negado pelo ente autárquico, foi feito com fundamento na falta de condição de segurado pelo ex-empregado do reclamado falecido, por conta de omissão do empregador.
A responsabilidade civil tem como fundamento o fato de que “ninguém pode lesar interesse ou direito de outrem”, disse o magistrado. Nesse sentido, explicou, o artigo 927 do Código Civil aponta que aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a fazer o ressarcimento do prejuízo causado.
Essa responsabilidade, prosseguiu o magistrado, surge da conduta ilícita do agente. O ato ilícito gera o dever de compensar a vítima. Portanto, a conduta injurídica causadora do dano representa o elemento desencadeador do direito à reparação. No caso presente, ressaltou, “se o empregador tivesse feito os recolhimentos das contribuições previdenciárias, cumprindo a lei, a viúva do falecido estaria a receber o benefício previdenciário, pensão por morte”. Para o magistrado, foi em razão da conduta omissa do empregador que adveio o prejuízo que a viúva busca reparação.
Assim, lembrando que para que se configure o dever de indenizar advindo da responsabilidade civil, sempre deve estar presente a ação ou omissão voluntária culposa do agente, relação de causalidade ou nexo causal e dano, o magistrado deferiu o pedido de pagamento de indenização por danos morais, condenando o empregador a pagar o valor correspondente à pensão que deveria ser paga pelo INSS, de acordo com as regras legais estabelecidas, na forma do que vier a ser apurado em liquidação de sentença, por perícia.
Despedida discriminatória
Na ação, os autores pediram ainda a condenação do empregador ao pagamento de indenização por danos morais, em virtude da dor moral decorrente da situação de desemprego causado por ato discriminatório, bem como o estado de penúria, por falta de fonte de sustento, em que se encontra a viúva do falecido. Nesse ponto, os autores relatam que durante o pacto laboral, a condição de saúde do trabalhador foi piorando à medida que o tempo passava, o que o levou a não conseguir mais desempenhar o seu labor com a mesma qualidade. A partir daí, dizem os autores, o empregador teria passado a tratar o trabalhador de maneira fria e distante, até que em novembro de 2016, após confirmação do diagnóstico de câncer, demitiu sumariamente o trabalhador, que veio a falecer em abril de 2017.
Em defesa, o empregador negou que tenha havido dispensa discriminatória, alegando que não tinha conhecimento da doença que vitimou o ex-empregado.
Sobre essa questão, o juiz revelou entendimento no sentido de que a despedida foi realmente discriminatória. Inicialmente, o juiz ressaltou que nos casos de trabalhadores rurais, em determinadas circunstâncias, o câncer pode ser considerado doença estigmatizante, “pois a anomalia, conforme a condição de saúde do doente, tem largo potencial para comprometer a produtividade do empregado rural e, com isso, configurar doença estigmatizante”. Além do mais, o magistrado frisou que o trabalhador era o único empregado da propriedade rural de seu empregador, o que sugere que a manutenção de empregado sem condições ideais de saúde geraria grande incômodo.
Depois de analisar o conjunto probatório constante dos autos, o magistrado revelou não haver dúvidas de que o falecido apresentou os primeiros graves sintomas incapacitantes do seu estado de saúde ainda durante o contrato de trabalho. Consta dos autos dois atestados médicos para afastamento por motivo de saúde, com durações de cinco e sete dias, ressaltou o magistrado. E, pela postura adotada em sua defesa, o empregador assume ter tido conhecimento dessa documentação durante a vigência do contrato de trabalho.
O magistrado disse ter estranhado a alegação da defesa do reclamado sobre pactuação amigável entre as partes de rescisão imotivada do contrato de trabalho em condições vantajosas apenas para o empregado, e com a finalidade exclusiva de atender a vontade deste em se vincular a outro contrato de trabalho. O magistrado disse que chamou a atenção, também, o fato da rescisão não ter sido submetida a homologação, conforme determina a lei.
A prova documental traça um quadro capaz de estabelecer certeza quanto ao conhecimento pelo empregador da incapacidade laborativa do falecido, único empregado à época da propriedade rural do reclamado, frisou o juiz, lembrando ainda que, além desse conjunto probatório, a prova oral produzida no processo confirma a tese de que o empregador tinha conhecimento do problema de saúde do empregado.
“Não há dúvidas de que a incapacidade laborativa foi o vetor motivacional a determinar a rescisão do contrato de trabalho, em virtude da equivocada opção menos onerosa feita pelo empregador, para livrar-se do empregado informal que não ostentava a condição de segurado e deixara de ser produtivo”, concluiu o magistrado ao deferir o pleito de pagamento de indenização por danos morais, arbitrada em R$ 30 mil.
Também foram deferidos os pedidos de anotação do contrato de trabalho na Carteira de Trabalho do empregado falecido e o de pagamento de salários em dobro no período entre o desligamento e a data de falecimento do trabalhador.
Cabe recurso contra a sentença.
(Mauro Burlamaqui)
Processo nº 0000898-55.2017.5.10.0861 (PJe)
Fonte : TRT10